quarta-feira, 3 de maio de 2017

Samba de Gafieira: origem e formas de se dançar

O samba a dois que dançamos hoje nasceu final do século XIX e início do XX com a construção de vilas operárias no centro do Rio de Janeiro. Classes com menor poder aquisitivo dessas regiões buscavam formas de lazer no meio urbano e começaram a surgir então as “gafieiras” (espécie de casa noturna da época).
Antes mesmo do samba surgir como gênero musical e de dança,  já havia o batuque africano (nome dado pelos portugueses às danças de origem africana), considerado a raiz do samba, que era dançando em filas ou rodas acompanhado de palmas. No surgimento do samba, o batuque africano (lundu e sua umbigada, mais rural ) era misturado com a polca européia, dando origem a primeira dança de par, o Maxixe, dança mais urbana, pai do samba de gafieira.

Por ter sua origem ligada a cultura africana, o samba foi bastante reprimido no seu surgimento. Considerado dança dos pobres, lasciva e imoral, somente com o passar dos anos, depois de domesticado e adaptado,  passou a ser aceito nos salões pelas elites brasileiras.



Formas de se dançar

Originado da primeira dança a dois urbana, o Maxixe que, musicalmente, marca um encontro da cultura negra com a europeia, o Samba de Gafieira, como forma de dança a dois também sofreu influências tanto da dança africana, caracterizada por movimentos que buscam a terra e a religiosidade do povo negro (o corpo busca o chão), quanto da dança européia, mais formatada pela corte imperialista e com movimentos mais sofisticados, oriundos da valsa (corpo busca o ar).
De acordo com Marco Antônio Perna, autor de “Dança de Salão Brasileira”, sempre existiram formas diferentes de se dançar a mesma dança, e com o samba não foi diferente. Em 1940 haviam três maneiras de se dançar: o samba liso, samba batucada e samba canção, que se diferem quanto ao compasso musical, números de pisadas e características.
Hoje no salão, de acordo com as classificações de Rudolf Laban, grande pesquisador da dança e autor do “Domínio do Movimento”, livro de referência que observa as danças quanto ao caráter, repertório e qualidade do movimento,  também podemos observar três formas consagradas de dançar o nosso samba: Liso ou Clássico, Tradicional e Funkeado.



Clássico

No clássico ou liso a postura tem um ar mais aristocrático e sua principal característica é a elegância com alinhamento vertical dos corpos e ginga mais discreta. É o samba mais adaptado ao Ballet. Musicalmente o chorinho combina bastante com essa forma. O dançarino mais conhecido a adotar esse estilo é Valdeci de Souza. No repertório puladinho, picadilho e piões contínuos, lisos e com tempo de execução maior. Outros dançarinos, mais contemporâneos, representantes dessa forma, são Alexandre Silva e Isis Lucchesi

Tradicional

Já no tradicional a ginga ganha maior importância com maior ênfase na flexão dos joelhos, postura mais relaxada, não há alinhamento ereto na vertical e os quadris dos dançarinos ganham maior projeção. Aqui o repertório que tem maior evidência são as escovinhas e os pica-paus, além de contribuições do tango como ganchadas,  enfeites de pernas para as damas e posição do tronco. As músicas características são, em sua maioria, sambas de bandas de baile, cujos instrumentos de arranjo são sopros e outros metais, inspirados nas antigas big-bands americanas. Carlos Bolacha é o principal ícone atual desse estilo. Os dançarinos mais atuais desse estilo são: Adriano Robinho e Evelin Malvares

Funkeado:

Samba Funkeado é a forma mais nova de se dançar samba. As principais características são mudança no tempo de execução dos movimentos, novas figuras criadas a partir do Tradicional e a interrupção de uma movimentação na metade para dar lugar a algo novo. Na parte corporal observa-se encaixes e desencaixes de quadril com variações de pausas e continuidades. Também dentro de um mesmo passo são explorados planos altos e baixos, característicos do samba Tradicional porém com pausas e quebras de movimentos que fazem alusão ao hip hop. Também a parte musical advém da cultura hip hop, podendo ser lançado tanto ao som do sambalanço, subgênero do samba,  quanto ao do R&B (rhythm and blues). O ícone atual e criador deste modo de se dançar samba é Jimmy de Oliveira.. Há também no cenário atual os alunos do Jimmy que vem disseminando o Funkeado. Dentre os muitos, os mais conhecidos são: Leo Fortes e Robertinha, Wendell Bright e Mary CorreiaRodriguinho Barcelos, Erika Ikuno e Moreno Zanandré, Rogerinho Contratempo e Ayla Contratempo

A arte dança também é cíclica

Observadores com noções de história da arte sabem que ela está sempre em movimento, e estes são, muitas vezes, cíclicos no que diz respeito às tradições e contemporaneidades. Ou seja, quando nosso samba chegou ao estilo Funkeado, que é o ápice no que diz respeito à modernidade, muitos sentiram a necessidade de voltar à raiz, dando força ao modo de se dançar Tradicional. Atualmente estamos em uma fase de busca das raízes. Por este motivo o samba Tradicional é o mais seguido e dançado atualmente nos salões brasileiros.

Fontes de pesquisa do resumo acima:
Livros: Dança de Salão Brasileira, de Marco Antônio Perna
Artigo “ O samba de gafieira e seus sotaques”, de Cristóvão Crhistianis, do livro Tango & Samba
Artigo: "História da Dança a Dois", de Ítalo Rodrigues Faria, da Arte Revista, 2013

Prof Silvia Caseiro
Canal no Youtube: Silvia Caseiro Dançarina
Página no Facebook: Facebook.com/silviacaseirodanca

terça-feira, 14 de março de 2017

Bolero é a mais romântica das danças de salão

“Bolero” no dicionário uma dança e música espanhola ou casaquinho curto feminino, nos salões a expressão mais antiga da dança romântica ou do romantismo propriamente dito.

 A origem histórica do bolero, assim como a maioria das danças de salão brasileiras, gira em torno de uma dança européia, mais especificamente espanhola, que ao chegar em Cuba se fundiu com as influências africanas e a partir daí foi disseminada pelo México, Argentina e Brasil. No entanto, vale lembrar que Bolero como música e como dança era bastante diferente do que hoje é conhecido por este termo e também não há um acordo definitivo entre os pesquisadores sobre o tema. Por esta razão a história do bolero e suas influências podem ser divididas em três momentos distintos:

 Origem espanhola, árabe e romana conhecida como “Bolero Primogênito” executadas em ritmo ternário. A esta categoria inclui-se o bolero dançado por Sebastian Lorenzo Cerezo; dançarino, primeiro criador de uma dança chamada Bolero em 1780. Algo interessante a se destacar no estudo histórico é que até a metade do século XIX havia bailes de danças em pares após as peças teatrais e que, nestas danças, a parte mais importante era reservada às damas, os cavalheiros apoiavam a expressividade da dança da dama e as ajudavam nos movimentos de elevações. Há relatos de que a palavra bolero pode vir de “volero”, referente a voar, porque as danças ciganas às vezes apresentam movimentos rápidos que parecem o vôo das aves.Talvez daí venha o nome do passo que chamamos de “voleio”, no qual as pernas vão para o alto em movimentos redondos acompanhando o quadril. No início a nobreza dançava o bolero como parte dos costumes, logo passou a ser dançado pelo povo e em seguida os bailarinos de teatro, daí nasce o “balé clássico espanhol”. A semelhança com o que acontece ainda hoje na sociedade não é mera coincidência.

De origem cubana e, posteriormente, América Latina é o “Bolero Latinoamericano” dançado em ritmo binário e interpretado de inúmeras maneiras em cada território. Aqui palavra bolero aparece de diversas maneiras: canción-bolero, bolero-son, bolero-beguin, bolero-moruno, bolero-tango, bolero-mambo, bolero-chá, bolero-ranchera, bolero-gitano e até bolero-rock. A característica principal deste bolero é que ele se origina do danzon do século XIX, que é a dança cubana com influências da Habanera e ritmos afroamericanos, “La romanza operática”, utilizando como base o son, a clave, foxtrot e até o blues. De acordo com a pesquisadora de dança de salão, Maristela Zamoner, a disseminação a partir de Cuba não aconteceu somente com o Bolero, mas também com o son, o danzón, a guaracha, o mambo e o cha-cha-chá entre outros. E dessa maneira o bolero se funde com outros gêneros como Bolero ritmico, Bolero Cha cha cha, Bolero Mambo, e inclusive a Bachata (bolero Dominicano), o Bolero Ranchero (mescla bolero e mariachí mexicano) e o Bolero Moruno (bolero com mesclas ciganas e hispânicas). Ressalta-se aqui que entre as décadas de 30 e 60, Cuba e México se tornaram distribuidores de artistas e arte para os países como Porto Rico, Venezuela, Colômbia, República Domenicana, Equador, Bolívia, Chile, Argentina e até Brasil e Espanha. A Primeira Guerra Mundial também contribuiu para a expansão do bolero visto que,  na América Latina não chegava influências musicais da valsa, passo doble e fox-trot vindos da Europa e Estados Unidos.

 E por último o “Bolero Carioca” que é um Bolero Latinoamericano, dançado no Brasil e que, apesar de ser estrangeiro, somente no Brasil é dançado da forma como se dança aqui. Tendo como ponto de partida a dança de salão nascida no Rio de Janeiro e disseminada para outros estados do país. Caracteríza-se pelo avançar e recuar sensual entre dama e cavalheiro deslizando os pés pelo chão, com giros, caminhadas e mudanças de direção, alternando entre rápido e lento. Sua base rítmica varia entre o binário e quaternário. Apesar da origem cubana ainda estar presente na música tradicional de bolero, ele também pode ser dançado ao som de intérpretes da música brasileira como Luisinho Rodrígues, Gilberto Gil, Roberto Carlos, Miltinho, Carlos Lyra, Vinicius de Moraes, Ivan Lins e Caetano Veloso. Atualmente também é possível dançar o Bolero em qualquer música lenta e romântica, incluindo rock melódico e pop.

Resumo da pesquisa de Maristela Zamoner: Bolero